O estudante carioca Thiago Arede, 23 anos, sempre gostou de
praticar esportes. Nas horas de folga seu lazer preferido era jogar futebol,
vôlei ou basquete. Também curtia sair com amigos e paquerar nas baladas.Mas nos
últimos anos ele vem sendo impedido de fazer tudo isso. Não frequenta mais as quadras
nem o campo de futebol. Não sai mais com amigos e perdeu a namorada.Toda a
mudança aconteceu depois que ele descobriu ser portador de homocistinuria,
enfermidade que impede o metabolismo de uma proteína por causa da falta de uma
enzima específica.
A proteína se acumula, causando complicações como formação
de coágulos sanguíneos, alterações musco-esqueléticas e danos à visão. A doença, que não tem cura, acomete um a cada 200 mil
nascidos. No Brasil há apenas 32 casos diagnosticados, incluindo o de Arede. O
jovem, portanto, é um dos portadores brasileiros de uma enfermidade rara. Trata-se
de uma população que vive um drama silencioso, marcada por barreiras que a
mantêm quase esquecida. Alguns podem até ter boa situação financeira, mas
vivem à margem das pesquisas médicas e das políticas de saúde. Também
dificilmente despertam o interesse da indústria farmacêutica para produzir
drogas que tratem suas dores. É uma angústia que começa na dificuldade para fazer o
diagnóstico. Arede, por exemplo, só soube o que tinha após peregrinar por quase
20 anos de consultório em consultório.E, agora, a luta é para conseguir se
tratar. Para repor a enzima que lhe falta, o rapaz ingere um suplemento
alimentar três vezes por dia. Cada lata custa R$ 1 mil. Ele consome sete por
mês. O jeito é recorrer à Justiça cada vez que precisa do remédio.
O mesmo recurso é usado pelo vendedor Wanderlei Fante, 42
anos, portador da doença de Fabry.
O mal também está relacionado à ausência de uma enzima, nesse caso uma que remove gorduras do organismo.
O mal também está relacionado à ausência de uma enzima, nesse caso uma que remove gorduras do organismo.

Esse tipo de batalha - a luta pelo acesso a alguma forma de alívio - também é conhecido da família da estudante Carolina Ferreira, 11 anos. A menina tem síndrome de Williams, doença causada por um defeito no gene responsável pela produção da elastina, proteína que dá elasticidade aos vasos sanguíneos, órgãos e à pele. Ela atinge uma em cada 20 mil pessoas e provoca anormalidades físicas e de desenvolvimento, além de comprometimentos neurológicos e cardiovasculares. Não tem tratamento, mas os pacientes precisam de cuidados de fisioterapeutas, fonoaudiólogos, além de cardiologistas. Algo difícil no Brasil."Há três anos esperamos uma vaga para a fisioterapia", lamenta Débora, mãe da menina. "Fazemos exercícios com ela em casa. Mas não é suficiente."
Apesar de desconhecidas pela maioria dos médicos, a ciência
já catalogou cerca de oito mil tipos de doenças raras. Dessas, pelo menos 550
são causadas por erros inatos do metabolismo. Ou seja, por distúrbios
hereditários que levam a alterações no funcionamento de enzimas responsáveis
pela quebra de estruturas complexas do organismo. "A ausência ou falta de
atividade dessas enzimas levam ao acúmulo de moléculas, comprometendo o
funcionamento do corpo", explica a pediatra e geneticista Ana Maria
Martins, coordenadora do Instituto de Genética e Erros Inatos do Metabolismo da
Universidade Federal de São Paulo.
A médica é uma das poucas especialistas que entendem de
doenças raras no País. Na verdade, além do centro da Unifesp, há um
serviço na Universidade Estadual Paulista, onde são conduzidas pesquisas, entre
elas sobre a síndrome de Wiliams."Essa doença não tem cura, mas queremos
conhecê-la melhor para oferecer um pouco de qualidade de vida aos
pacientes", afirma a biomédica Deise Helena de Souza, da instituição
paulista.
Essas são iniciativas isoladas, que estão longe de atender
às necessidades das vítimas de doenças raras no Brasil. Na verdade, um passo
que poderia ajudar muito ainda não saiu do papel: a criação de 200 centros de
referência em genética médica (a maior parte das doenças tem origem em erros no
DNA).
Entre outras atribuições, caberia a esses serviços treinar
profissionais de postos de saúde para reconhecer crianças com sinais de doenças
deste gênero e encaminhálas a um centro especializado.
O Ministério da Saúde garante que até o final do ano dará
início à implantação do serviço. No começo serão feitos exames diagnósticos. Já
para o tratamento, os pacientes deverão preencher protocolos para saber como
cada um poderá ser tratado. "Há casos em que os remédios não surtiriam
mais efeitos, por isso as pessoas terão de ser avaliadas individualmente",
explica a médica Helena Maria Pimentel, consultora técnica do Ministério da
Saúde.
ESPERA Carolina sofre com problemas neurológicos. Ela não
consegue vaga para fazer fisioterapia há três anos
Matéria retirada da ISTO È 25/02 /2012
Matéria retirada da ISTO È 25/02 /2012
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